As desigualdades de gênero impostas no nosso dia a dia são fruto de uma consciência e paradigma já “pré-estabelecidos” que foram construídos e vem sendo mantidos há tempos. Opressão, perpetuação de estereótipos, violência física e psicológica são apenas alguns exemplos das consequências da falta de preocupação com a abordagem desta temática desde a infância.

Entre as idades de 3 e 5 anos, as crianças começam a desenvolver sua identidade de gênero e começam a entender a diferença entre “menino e menina”. Quase imediatamente depois de se tornarem cientes disso, começam a desenvolver “estereótipos”, que se aplicam a si mesmos e aos outros, em uma tentativa de dar sentido e ganhar a compreensão sobre a sua própria identidade. Esses estereótipos são razoavelmente bem desenvolvidos entre os 5 e 7 anos de idade, tornando este um período crítico para lidar com a temática. Quando internalizados, os estereótipos negativos impactam no entendimento que a criança tem do mundo a sua volta; na sua autoestima; e até mesmo em seu desempenho acadêmico. É, portanto, papel do educador desenvolver um senso positivo a respeito das questões de gênero e igualdade, trabalhando ativamente para neutralizar preconceitos e reduzir danos, contribuindo para a construção de uma infância sem violência física, psicológica e autônoma.

Por que educar as crianças para a igualdade de gênero?

Pensar em estratégias para formar o educador para lidar com tais questões podem contribuir para uma educação voltada ao respeito, liberdade, empatia, menos violenta e opressora. Quando abordados desde cedo, os temas trazem uma elucidação a questões como igualdade de direitos e liberdades, reconhecendo e valorizando meninos e meninas, em suas individualidades. O trabalho com igualdade de gêneros e empoderamento infantil promove o respeito pelos desejos e expressões de cada um, contribuindo com o rompimento de relações de dominação.

O estabelecimento de igualdade de direitos e respeito entre homens e mulheres está diretamente relacionado com o desenvolvimento das sociedades. Ao longo dos tempos, muitas mulheres lutaram – e ainda lutam – para que o seu papel no mundo seja valorizado, de uma forma justa. Estamos diante de um momento decisivo na história da educação. Devemos reconhecer que, no meio de uma magnífica diversidade cultural, de formas de vida e novas manifestações, somos uma comunidade com um destino comum. É preciso então somar forças para gerar uma sociedade sustentável baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para este fim, é imperativo que nós declaremos nossa responsabilidade com as futuras gerações. Se quisermos que as crianças cresçam socialmente conscientes é preciso educá-las para compreender e defender a igualdade de gênero.

A educação é um pilar necessário para a construção de uma infância baseada no respeito, tanto dentro como fora da escola, que desconstrua paradigmas e ideias pré-estabelecidas. As crianças observam, absorvem e, consequentemente, perpetuam muitos padrões, atitudes e discursos. Trabalhar a desconstrução desses padrões é garantir que elas cresçam em segurança para exercerem sua individualidade, livres de preconceito, violência e confiantes para ser o que quiserem – como quiserem.

Então como ?

Esta não é uma tarefa fácil – e nem há manual de instrução de como fazê-lo. Devemos, então, ficar atentos a nossas ações diárias – que refletem e reforçam estas desigualdades. Primeiramente, cabe a nós, educadores, pais e comunidade escolar entender e descontruir os estereótipos de que todo o menino é forte, corajoso, destemido e líder, assim como também desconstruir que toda menina é frágil, delicada, princesa, linda, medrosa, obediente e sensível. Isso está presente em muitas das falas dos adultos e precisamos urgentemente parar de dizê-las: “Isso é coisa de menina”; “Menino não chora”; “Senta que nem mocinha”; “Isso é brincadeira de menina”; “Engole o choro”; “Você tem que ser forte, já é um homenzinho”; “Menina não fala essas coisas”; “Azul não é cor de menina”; “Rosa não é cor de menino”; “Boneca é coisa de menina” e etc.

Sobre isso, um trecho do livro Gênero, uma perspectiva global, de Raewyn Connell e Rebecca Pearse:
“Ideias sobre comportamentos adequados a cada gênero circulam constantemente, não apenas pelas mãos de legisladores, mas também nas atitudes de padres, pais, mães, professores, publicitários, donos de ponta de estoque, apresentadores de talk-shows e DJs. Eventos como a cerimônia do Oscar e o Super Bowl não são apenas consequências de nossas ideias sobre diferenças de gênero. Efetivamente, ajudam a criar essas diferenças ao exporem masculinidades e feminilidades exemplares.”

Existem outras pequenas – e grandes – atitudes que podem mudar a forma como ensinamos e lidamos com o assunto. Então aqui vai uma coletânea de sugestões:
· Apresentar os diferentes gêneros, famílias e culturas;
· Eliminar a discriminação em todas as suas formas;
· Trazer fatos/dados históricos sobre a desigualdade e luta das mulheres ao longo dos anos;
· Analisar o papel das mulheres apresentado nas mídias (propagandas, filmes, desenhos, brinquedos, etc);
· Promover uma cultura de tolerância, não violência e paz;
· Assegurar – sempre – os direitos das mulheres para acabar com a violência contra elas;
· Promover a participação ativa de meninas e meninos neste processo;
· Estimular e apoiar o entendimento mútuo, a solidariedade e a cooperação entre todos eles;
· Programar estratégias amplas para prevenir conflitos e usar a colaboração na resolução de problemas para administrar e resolver disputas;
· Empoderar as meninas: mediar e fornecer ferramentas que as auxiliem neste processo de protagonismo;

É preciso, mais do que nunca, educar as crianças para a liberdade.

Thatiana Passi
Educadora e aprendiz

Referências:

http://www.southernearlychildhood.org/upload/pdf/Why_Does_Gender_Matter_Counteracting_Stereotypes_With_Young_Children_Olaiya_E_Aina_and_Petronella_A_Cameron.pdf

https://teachunicef.org/sites/default/files/documents/units-lesson-plans/gender_equality_-_an_introduction.pdf

www.earthcharter.org

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