Por Ana Célia Mustafá Campos
O fechamento das escolas abriu a oportunidade para a tecnologia finalmente entrar nas salas de aula. E isso é o que de melhor poderia ter acontecido para os alunos que, em pleno século XXI, ainda eram obrigados a ficar sentados, presos a um modelo que não estava sendo bom para ninguém.
Há anos vemos um abismo entre a pedagogia, que pressupõe alunos ouvintes, e a nova educação, onde os professores são provocadores de sinapses.
Mas é muito difícil ser provocador de sinapses se a escola tem somente uma metodologia. Aquela de sempre. Aquela que fazemos, pois é assim que sabemos fazer. Aquela que nos foi dada há 40 anos e, por isso, repetimos.
O momento atual é um grande presente aos alunos.
Com a obrigatoriedade de todos terem sido pressionados a aprender a utilizar a tecnologia para se comunicar, trabalhar, dar e receber aulas, o avanço nas possibilidades foi incrível!
Sim, muitas crianças sofreram e – continuarão sofrendo – com educadores e instituições que simplesmente “professam suas matérias”, só que dessa vez no digital. Por outro lado, algumas escolas foram além do investimento em computadores e redes. Investiram fortemente na formação continuada de professores para que criassem experiências significativas de aprendizagem, e não “dessem aulas” no ambiente on-line.
Essa sim é a verdadeira mudança, pois os alunos já sabem utilizar as plataformas! Afinal, são nativos digitais (clique aqui para saber mais sobre o assunto). Estão prontos. Só precisam ter espaço, serem motivados a criar, a pesquisar, a buscar respostas, a trabalhar em grupo e em projetos de seu interesse. E aqueles que não tinham a oportunidade de utilizar devices tecnológicos, ao recebê-los, rapidamente se adequaram e começaram a explorar todas as suas possibilidades de uso.
Conclusões baseadas em fatos.
Nesses mais de cinco meses de experiência de ensino a distância, nossos alunos de 4 a 6 anos de idade tiveram avanços notáveis em seu processo de alfabetização. A necessidade alavancou o aprendizado. O medo dos educadores foi transformado em entusiasmo ao se depararem, em julho, com a maioria das crianças de 6 anos alfabéticas!
Em outros casos, alunos com TDAH, Asperger e até aqueles cujos diagnósticos ainda são nebulosos, tiveram seus primeiros 10 no boletim após 4 meses de propostas a distância! Isso porque não foram, durante esse período, obrigados a se enquadrar em uma rotina; eles puderam fazer suas atividades sozinhos, no seu tempo, à sua maneira. Com o mundo a seus dedos, evoluíram.
E como não mencionar o aprendizado em relação às aulas de professores especialistas? Quem disse que Arte só pode ser dada em salas com mesas e bancos grandes (em algumas escolas, esse é o único espaço onde os alunos sentam em grupos!)? E que a Educação Física não pode acontecer fora da quadra? Não só foi possível fugir desses cenários, como foi lindo acompanhar o quanto esses profissionais são capazes de se reinventar e levar, via tela, o movimento, a criação, a arte, a literatura, a poesia, o espanhol, o inglês, a ioga, o judô.
Assusta-me escutar profissionais que continuam com o discurso de que a tela é prejudicial, de que nada substitui o presencial e o contato físico. Assustam-me aqueles profissionais que viraram especialistas em dar palpites sem terem dados do que realmente pudemos vivenciar nesses últimos meses.
Foi estrondoso o barulho que essa oportunidade trouxe! Os avanços são notáveis. Foi uma emancipação para todos, em todas as áreas, inclusive para os alunos que não podiam frequentar uma escola. Com acesso à internet e computadores ou tablets e um educador que compreende os recursos tecnológicos e tem mente aberta, ninguém segura esse estudante! É garantia de processos de aprendizagem poderosos, pois a aprendizagem pode acontecer (e acontecerá) em qualquer lugar, sempre que houver disponibilidade para a troca, para a pesquisa, para o brilho nos olhos dos alunos que descobrem o novo a partir de seus interesses.
Professores nunca serão substituídos. O chão da escola sempre será palco de troca. A socialização é fundamental para o ser humano. A tela em excesso faz mal. Mas o momento é emancipatório! Só não percebeu ainda quem não está aberto a conhecer as novas e incríveis possibilidades que a tecnologia oferece ou quem não teve o prazer de acompanhar e avaliar, como eu, o trabalho de 80 professores, com 450 crianças de 2 a 10 anos de idade. Esses profissionais protagonizaram um novo modelo de ensino e, após 4 meses, constataram que o que aconteceu foi lindo de ver, abriu portas, janelas, corações e mentes para uma evolução mais do que necessária e urgente na educação brasileira!
*Artigo escrito por Ana Célia Mustafá Campos, sócia e diretora pedagógica da Builders Educação Bilíngue e da Garatuja Educação Infantil.